31 outubro, 2007

"A Palmeira"

A caminho das praias do Bilene, do Xai-Xai ou de Inhambane, era forçoso passar na vila da Palmeira, precisamente a 100 km de Lourenço Marques, agora Maputo.
Mas havia sempre um desafio nessa viagem.
A primeira pessoa que avistasse a Palmeira, tinha de gritar:
-
Palmeeeeeeeeeeeeeeeeeira!

Logo, ficava tudo à coca para ver se conseguíamos o feito!

Era uma palmeira gigante, com uma bossa a meio do caule, levemente inclinada, imponente.
Tem uma história e vou transcrevê-la.

Quem segue pela EN1 a caminho do Bilene, não pode deixar de reparar na gigantesca palmeira que se ergue perto da Manhiça, num centro administrativo que dela retirou o nome; já Gago Coutinho hà 100 anos atrás se guiou por esta magnífica árvore ao efectuar o levantamento cartográfico do país.



...melhor dizendo, repararia, se um violentíssimo relâmpago não a tivesse deitado por terra no passado mês de Agosto(2004).
Aqui fica, em jeito de memorial, uma homenagem a esta centenária árvore que ninguém sabe ao certo quando e como nasceu, mas que todos conheciam e estimavam...
Adeus Palmeira!


http://digitaldaguerreotype.blogspot.com/2004/10/moambique-palmeira.html





Bem, eu também a fotografei, rendi-lhe a minha homenagem e fiquei feliz por ter encontrado uma nova palmeira a crescer no seu lugar…


…esperando que nenhum raio a parta!!!!

- Boa sorte, Palmeira….!!!!

30 outubro, 2007

"Mãe"

No Mercado Central do Maputo, vulgarmente chamado Bazar por quem lá viveu, andei a correr a fazer as últimas compras para trazer: artesanato, pó de caril, caju.

E ouvia as vendedeiras chamar: mãe…mãe…
Depois mostravam os produtos que queriam vender.


Impressionou-me, francamente!
Carinhoso tratamento, achei, em vez de patroa, senhora, que se ouvia noutros tempos…
E fiquei de coração mole, confesso.
Acabei por comprar sempre mais alguma coisa para evitar receber trocos.

Confesso que durante a minha estadia dei gorjetas enormes.
Impensáveis aqui em Portugal!
Porque sabia que a grande maioria dos moçambicanos têm ordenados muito baixos.

Pensei:
- Quando voltarei?
- Porque não tornar felizes algumas pessoas, nem que seja apenas por um dia?

Ainda hoje me soa aos ouvidos o chamamento:
- Mãe…mãe…

(Imagens da net)

28 outubro, 2007

Há dragões e dragões…


Eu, dragãozinho me confesso, que apesar do meu feitio impulsivo, repentino, sou manso e humilde de coração, alegre, bem-humorado, louco e enamorado!

Mas tive de pedir ajuda…
A São Jorge, o santo guerreiro...



Porque há dragões e dragões....
E alguns são mais assanhados que outros!!!!!

27 outubro, 2007

Home...

Engraçado, em português não existe palavra com este significado.
Só se for “a nossa casa”, “o nosso canto”...sei lá!
Conhecem alguma?

Porque esta palavra tem uma força enorme.
Não representa só a casa, mas sim o lugar onde nos sentimos “em casa”.

E para mim, esse lugar físico, místico, agradável, seguro, não é só esta casa onde vivo.

Tem tudo a ver com a pessoa que amo, com quem partilho o dia a dia, para o bem e para o mal.

Esse lugar é agora aqui.
Mas podia ser em qualquer parte do mundo, desde que estivéssemos lado a lado.
Desde 25 de Outubro de 1972.

E já lá vão 35 anos!

Uma vida, não acham?


23 outubro, 2007

Por terras de África X

Sonhei com …
Paisagens deslumbrantes
Águas mornas e mansas
Sítios com memórias
Gentes com histórias.

Senti…
Nostalgia do passado
Emoções à flor da pele
Sensações já perdidas
Presenças invisíveis.

Colhi…
Alegrias benfazejas
Sabores olvidados
Flores de esperança
Afectos inesperados.

Vivi...
Momentos
Para não mais esquecer.
Escultura (aeroporto do Maputo)

22 outubro, 2007

Por terras de África IX

Na véspera de vir para Portugal, o céu abriu-se, o sol raiou...
Fiz uma excursão de um dia à praia do Bilene, apenas com o motorista por companhia.
Como poderia, depois de tantos anos afastada, nem mergulhar nas águas do Índico?
Como disse atrás, impossível!

Às 7 e meia da manhã estava o Sr.Vilanculos à porta do prédio para me apanhar para a minha viagem até à praia, a cerca de 190 km do Maputo.
Mal saímos da cidade e da confusão de gente e carros, as diversas tonalidades de verde tomaram conta da paisagem.
Machambas, árvores tropicais, gado, algumas casas, palhotas.
Mato...!

A conversa foi rolando, fazendo a ponte entre o passado e o presente, resultado da idade do meu companheiro de viagem, 50 anos.
A estrada muito boa, foi ficando vazia à medida que nos afastávamos da cidade.
Manhiça, Palmeira, baixa de Xinavane, Macia.
E por fim, a praia do Bilene.
Eis as fotos.

Entrada da Manhiça

Cajú em saquinhos, pendurados em arbustos para venda!



A "falecida" Palmeira, na vila do mesmo nome


A nova palmeira!

Um belo friso de moçambicanas que posaram para a foto


Estrada da praia do Bilene

Sacos de carvão e lenha para venda à beira da estrada

Chegados à praia do Bilene, estacionámos dentro do Complexo Palmeiras, onde iria almoçar.

Escolhi o almoço para os dois e o motorista foi dar uma volta até à hora do almoço.
Desci para a praia, tirei os chinelos, enterrei os pés na areia branca.
A praia estava deserta.

Tirei a roupa, arrumei o saco junto a um dos chapéus da praia, dirigi-me para a água com o coração aos saltos.
Entrei, devagarinho.
Água morna, agradável.
Sozinha, fui a rainha do Bilene...






Dei umas braçadas, mantive-me quase uma hora na água.
Olhando, absorvendo toda aquela beleza.
Deixando ali, naquelas águas tépidas as minhas derradeiras mágoas, a minha saudade para sempre.
E ali fechei um capítulo da minha vida.

Por terras de África VIII


Já só faltavam 3 dias para regressar a Portugal e o tempo continuava enfarruscado.
Vento, nuvens, alguns chuviscos, tempo de transição entre inverno e verão, nem carne nem peixe.
Desisti de ir à Ilha da Inhaca, era apertado.
Estava a ver que me vinha embora sem mergulhar nas águas do Índico…
Impossível!

Resolvi então, para começar, tomar uma banhoca na piscina do Hotel Girassol, já que a do Hotel Polana só aceita clientes.
Passei uma parte do dia na piscina, almocei, dediquei-me à leitura, relaxei.
Sozinha, mais ninguém se atrevia a ficar assim, com sol espreitando envergonhado, brisa, por vezes forte, nuvens ameaçadoras!
Mas deixei-me ficar…





As vistas, as flores...
Um chamamento!








E assisti, divertida, ao ensaio e gravação para um programa de televisão, de clips pedidos…

Quando acabaram as gravações os participantes despediram-se de mim, a única espectadora, com grandes acenos.

Pedi para me chamarem um táxi e antes de me dirigir a casa, resolvi fazer mais uma volta na cidade. Combinei o preço com o taxista e o itinerário.
Também não era fácil a visita a seguir.

Uma rua pequena mas com muitas recordações para mim.
A minha escola primária, o Colégio Lis.
A casa, ao lado, um 1º andar, onde morei.
A Clínica Lourenço Marques onde perdi a minha mãe.

Tudo na mesma rua.



O carro parou em frente da escola, agora “Associação dos Continuadores de Moçambique”.
Entrei, a porta estava aberta, Percorri o corredor, espreitei para a minha sala de aulas, recentemente pintada, vazia.

Bati a uma porta, saíram umas alunas e pedi para chamarem o professor.
Disse que gostaria de visitar a escola, como ex-aluna.
Levaram-me para o primeiro andar, antiga residência da professora, onde expliquei ao que vinha e assentiram sem dificuldade.
Fui acompanhada por um empregado que, conhecendo as pequenas alterações sofridas no edifício, as ia descrevendo.
Cheguei ao pátio e disse-lhe:
-Sabe, isto estava cheio de baloiços! E eu morei naquele primeiro andar…
Ele sorriu.
Despedi-me, agradecendo.

O carro continuou o caminho, deitei um olhar ao prédio da clínica, agora Conselho Fiscal.
Mais um aperto no peito. Respirei fundo.

Regressei a casa, passando por locais conhecidos.
Chovia.
Será que o céu nos entende e também chora?

21 outubro, 2007

Por terras de África VII


Mãe e filha

A visita seguinte era de peso, iria precisar de toda a minha força para conseguir aguentar sem soçobrar.
A entrada do cemitério estava atulhada de gente. Tinham-me dito que era de tarde que se faziam a maior parte dos funerais.
Depois de entrar a custo pela porta principal, segui o caminho que me iria levar junto do lugar onde a minha mãe tinha sido sepultada há 50 anos atrás.

Pelo caminho, comecei a ficar impressionada, olhando os jazigos, com as portas arrombadas, os vidros partidos, completamente vazios.
Campas profanadas, partidas, abertas. Absolutamente tétrico.
Tive medo de escorregar ou tropeçar tal era a confusão e cair dentro de alguma delas…

Depressa me apercebi que iria ser complicado completar a minha missão.
As ruas secundárias, perpendiculares e paralelas à rua principal, tinham desaparecido, completamente inundadas de campas recentes.
Voltas e mais voltas, alguns rapazes que habitualmente limpam e ajudam os visitantes a procurar também.
Nada!

Sugeriram então que fosse ao escritório, consultar os livros: sabendo a data encontraria o registo e o talhão.
Um primeiro livro, depois um segundo e finalmente os registos de 1957.
Desfolhei o livro, ansiosa.
Janeiro, Fevereiro, Março…
O resto das folhas tinham sido arrancadas…
Maio de 1957…
Nada restava.

Saí do escritório e os rapazinhos esperavam cá fora o resultado para recomeçarem a procurar. Foram atrás de nós e continuaram a ajuda na procura.
Nada!

Fazia-se tarde. O cemitério estava vazio.
Desisti.

E um pensamento acudiu à minha mente, dando-me uma enorme serenidade.
Como se uma voz me dissesse:
- Minha filha, que procuras aqui, se toda a vida andei por perto e te protegi?

Regressei ao carro, que tinha ficado afastado e sentei-me.
Percebi, afinal, que não tinha ido ali fazer nada.
Porque a minha mãe já ali não estava há décadas.


A desordem é total

“Isto já deixou de constituir um lugar sagrado. Os munícipes transformaram o cemitério de Lhanguene num lugar público de diversão – não respeitam as campas. Está sendo difícil controlar a situação porque o cemitério é grande e nunca se sabe quem mora dentro do cemitério e quem não é daqui” – Alexandre Libombo, administrador dos cemitérios”

http://www.canalmoz.com/default.jsp?file=ver_artigo&nivel=0&id=&idRec=2212

18 outubro, 2007

Por terras de África VI

Colocaram-se dois pneus novos no carro, dado que os outros estavam “ovalizados” e o carro parecia uma dançarina de hula-hula acima dos 90 km/hora!
Feitas as últimas compras em Riverside Mall, regressámos ao Maputo com a bagageira a abarrotar de prendas para as netas, filhos, amigos…
Na fronteira tive de tirar um visto para entrar em Moçambique, mas felizmente foi rápido.
Tomar banho, arrumar roupas, descansar.
Tínhamos uns petiscos à espera: chamuças, rissóis, croquetes e coca-cola, claro!!!!

No dia seguinte era preciso ir ao mercado e ao escritório da TAP confirmar a passagem de regresso.
O mercado é, hoje em dia, um lugar para se ter algum cuidado ao circular.
Com as carteiras…
Mas foi muito interessante esta visita: comprei caju, vários artigos em palhinha, pó de caril.





Depois, dirigimo-nos à Casa Elefante, em frente do mercado, para comprar capulanas.
A escolha foi difícil dada a oferta ser variadíssima!
Fiquei baralhada, mas lá me safei!

Estacionou-se junto ao Edifício Pestana Rovuma, antigo Prédio Funchal e aproveitei para entrar na Catedral.

A Catedral está muito bem conservada, como era antigamente.
Aí, vá-se lá saber porquê, as lágrimas correram cara abaixo…

Numa agência de turismo arranjei um carro com guia por 3 horas nessa tarde.
Destinos: ex-oficina do meu pai, casa da Matola e cemitério.

“A Cromalite”, assim se chamava a oficina. Cromagem, niquelagem, montagens eléctricas em fábricas, quadros eléctricos, etc.
Pintada de novo, mas no passeio havia lixo que chegava…
Tinham-me dito que funcionavam ali os correios, mas afinal deve ter sido comprada por alguém para viver.

E lá estava o pequeno portão onde a Negrita me vinha cumprimentar com o seu méeeeeeeeee…

Rumo à Matola, a cerca de 12 km do Maputo, agora com auto-estrada com portagem, subimos a rua já sem alcatrão até à vivenda que nos pertenceu.

Conversei com a senhora, agora sua proprietária, entrei para o jardim e quintal, tirei fotos.
A casa, agora pintada de rosa, está muito bonita e o jardim e quintal muito bem tratados. Tudo com muito gosto, deu gosto ver...
A enorme estufa de antúrios já não existe e no seu lugar está uma oficina de mecânico.
Por cima da garagem, o salão de festas que nunca chegou a ser usado para tal, com uma varanda a toda a largura (agora fechada), com vista para os Montes Libombos e os belíssimos por-de-sóis….


Despedi-me chorando. Não pude evitar, por todas as lembranças que aquela casa me trazia.
Voltámos para a cidade, mas a prova de fogo viria a seguir.